Após o Supremo Tribunal Federal (STF) interromper, mais uma vez, o julgamento do marco temporal, senadores se movimentam para acelerar a análise do projeto de lei sobre o tema. Um pedido de urgência com 24 adesões foi protocolado, e líderes vão pressionar o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), na próxima reunião, marcada para quinta-feira (15).
O regime de urgência é utilizado para apressar a tramitação e a votação das matérias legislativas e dispensa prazos e formalidades regimentais para ter a votação acelerada em relação às demais propostas, podendo, até mesmo, não ser analisado pelas comissões
Pacheco já declarou que a proposta passará pelas comissões temáticas, não indo direto ao plenário, como ocorreu na Câmara. "Queremos dar uma solução, encontrar um grande consenso sobre o tema. O mais importante é o interesse de todos os brasileiros, e os povos indígenas obviamente se inserem nesse contexto de brasileiros que merecem respeito", declarou Pacheco.
Pela tese do marco temporal, somente podem ser demarcadas como terras indígenas aquelas que estavam ocupadas por comunidades em 5 de outubro de 1988, dia da promulgação da Constituição.
Mesmo com a análise nas comissões, os senadores da bancada ruralista agem para que a discussão do projeto não se alongue nos colegiados. O grupo quer a matéria aprovada antes do recesso parlamentar, que começa em 18 de julho. "Vamos discutir essa urgência na análise durante a reunião de líderes. É preciso que o Congresso se posicione sobre esse tema, faça o papel legislador", defendeu o senador Izalci Lucas (PSDB-DF).
O senador Jorge Seif (PL-SC) também é favorável ao projeto e alega que, sem o limite, o agronegócio brasileiro será inviabilizado. "O agro é responsável praticamente por 30% do nosso Produto Interno Bruto. O agro que alimenta o Brasil, o agro que alimenta o mundo, o agro que mantém de pé a economia. A rediscussão, a inovação retrógrada de demarcação de terras indígenas, vai levar à conflagração: povos vão brigar", disse.
Tramitação
A ideia é de que o projeto comece a ser discutido na Comissão de Agricultura e Reforma Agrária. A presidente do colegiado, senadora Soraya Thronicke (União-MS), designou o próprio nome para relatar o projeto. Ela disse que já tratou do tema com o ministro da Agricultura, Carlos Fávaro, e que vai afinar o debate com outros integrantes do governo federal e com representantes das partes interessadas.
"Temos uma situação de insatisfação de todas as partes: dos indígenas, produtores rurais. Uma dificuldade muito grande de entrar em um consenso. Entendo que precisamos trabalhar juntos para atingir o objetivo, que é satisfazer todas as partes envolvidas. Para isso, não vou poupar esforços", disse a senadora
O tema também precisará passar pela Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) antes de ir ao plenário. Os senadores da bancada ruralista querem evitar que a decisão do STF saia antes do que a votação do projeto no Congresso.
Governistas, por outro lado, tentam reverter a decisão da Câmara. Líder do governo no Congresso, o senador Randolfe Rodrigues (sem partido-AP) alega que a proposta é um ataque aos direitos dos povos originários e que trabalhará para reverter "esse retrocesso".
Na mesma linha, o senador Humberto Costa (PT-PE) esperava segurar o debate enquanto o tema fosse analisado pelo STF. Mas com o adiamento e a pressão da bancada ruralista, já inicia o movimento contrário à aprovação. "No Senado, vamos lutar para reverter esse cenário. Toda a mobilização contra este retrocesso é necessária", disse.
Julgamento no STF
O Supremo chegou a retomar o julgamento do marco temporal na quarta-feira (7), mas, após um novo pedido de vista, o debate foi novamente interrompido. O pedido veio por parte do ministro André Mendonça, que terá até 90 dias para dar o parecer.
Por enquanto, três ministros já se manifestaram. Alexandre de Moraes e o relator do caso, Edson Fachin, votaram contra a tese, ou seja, para eles, a demarcação de terras pode ocorrer em áreas ocupadas por indígenas mesmo depois da promulgação da Constituição de 1988. Segundo Fachin, o artigo 231 da Constituição reconhece o direito de permanência desses povos independentemente da data de ocupação.
Moraes afirmou que o tema é uma das questões mais difíceis de ser enfrentadas não só no Brasil, mas no mundo. De acordo com o ministro, a discussão é juridicamente complexa e vem causando insegurança jurídica e afetando a paz social.
Já o ministro Nunes Marques foi a favor do marco temporal. No voto, ele considerou que os interesses dos indígenas não se sobrepõem aos da defesa nacional. O STF começou a julgar o caso em 26 de agosto de 2022.